quarta-feira, 5 de agosto de 2020

25 ANOS DO CAMPUS DA UECE DE TAUÁ


João Álcimo Viana Lima
(Artigo publicado no jornal O Povo, em 5/8/2020)

A música “Conversa de botequim”, gravada por Noel Rosa em 1935, retrata o tempo e o mundo de seu compositor intérprete, quando a malandragem e a boemia carioca eram por ele exaltadas, cantadas e vivenciadas. 60 anos depois, no sertão nordestino, os botequins foram alçados à condição de ambientes, cujas conversas seriam impactadas pela presença da instituição universitária em seu território.

Como síntese das justificativas para o fortalecimento da interiorização universitária, o então reitor da Uece, professor Paulo de Melo Jorge Filho, asseverou que “quando uma universidade se instala em uma cidade mudam até as conversas de botequim”. Sob esse prisma, em junho de 1995 foi implantado o Centro de Educação, Ciências e Tecnologia da Região dos Inhamuns (Cecitec).

Após 25 anos de sua fundação, o legado do Campus de Tauá tem relação conceitual ou empírica com aspectos e valores inerentes às universidades, tais como o princípio da liderança, a relação entre a dimensão universal e a regional, o espírito replicante e plural e a utilidade social. Nesse percurso, o fortalecimento da educação assentado em mais de 800 profissionais qualificados em licenciaturas, a geração de oportunidades e de melhores perspectivas regionais compõem um conjunto de influências resultantes dos trabalhos desenvolvidos pelo Cecitec.

No ano de seu Jubileu de Prata, não obstante sua credenciada vocação para a formação de professores e a repercussão favorável da performance profissional de seus egressos, paira o sentimento de que o Campus de Tauá, com base em ações planejadas estrategicamente e com a garantia orçamentária estadual, necessita expandir a oferta e a natureza de seus cursos. Para tanto, é indispensável atentar-se para os princípios históricos da universidade pública e as demandas prevalecentes e mutantes do contexto microrregional.

Ademais, é inegável que o Cecitec, com sua credencial de protagonismo no Sertão dos Inhamuns, tem influenciado na qualificação das conversas, mas, sobretudo, na educação e nos diversos setores da sociedade que são por ele alcançados, direta ou indiretamente.

Disponível em: https://mais.opovo.com.br/jornal/opiniao/2020/08/05/joao-alcimo-viana-lima--25-anos-do-campus-da-uece-de-taua.html

OS EFEITOS DA PANDEMIA NO FUNDEB


João Álcimo Viana Lima
(Artigo publicado no jornal O Povo, em 13/6/2020)

Se não bastasse a preocupação com o iminente fim do FUNDEB e com a não aprovação, até o momento, de um novo fundo para a manutenção e o desenvolvimento da educação básica pública brasileira, a pandemia da Covid-19 vem impactando perigosamente na retração das receitas educacionais nos últimos meses.

O FUNDEB, constituído por recursos oriundos de um conjunto de impostos e transferências legais, sentiu de imediato os efeitos da recessão econômica. Convém lembrar que no final de cada ano é publicada uma portaria interministerial com a estimativa do FUNDEB para o exercício seguinte, com base na matrícula e na previsão da arrecadação tributária. Embora se trate de uma estimativa, os valores anunciados servem de parâmetro para o planejamento anual de cada sistema ou rede de ensino.  Dessa forma, quando se estabelece uma relação deficitária entre a previsão inicial e a receita consolidada, a lógica do planejamento é seriamente comprometida. Os prejuízos tendem a se acentuar nos municípios de arrecadações próprias pouco representativas.

Dados levantados apontam que em maio de 2019 os repasses no âmbito do FUNDEB para os municípios cearenses representaram um índice de aproximadamente 7% superior à média mensal prevista. Por seu turno, a receita do aludido mês em 2020 foi inferior em aproximadamente 21% à média mensal estimada.

Esse cenário de incertezas quanto à superação do coronovírus e de recuperação da economia nacional requer dos dirigentes municipais a urgente tarefa de replanejamento, de modo a evitar um eventual colapso administrativo e a preservar os compromissos básicos, como o pagamento de pessoal e das despesas regulares de manutenção.

Além disso, os entes federados, na execução de parte dos recursos provenientes da LC nº 173/2020, não estão impedidos de contemplar as demandas educacionais, drasticamente afetadas em suas fontes regulares de financiamento. Pelo contrário, a despeito da inaptidão revelada pela atual direção do MEC, é imprescindível que haja a convergência de ações para que sejam minimizados os danos provocados pela pandemia na educação pública.

Disponível em: https://mais.opovo.com.br/jornal/opiniao/2020/06/13/joao-alcimo-viana-lima--os-efeitos-da-pandemia-no-fundeb.html



sábado, 6 de junho de 2020

MENTALIDADE COLONIAL E ENSINO SUPERIOR




João Álcimo Viana Lima
(Artigo publicado no jornal O Povo, em 6/3/2020)

No período colonial, o Brasil foi penalizado com a decisão do governo português de não permitir a instalação do ensino universitário em suas colônias. Com efeito, seus primeiros cursos superiores somente foram instituídos a partir de 1808, após a instalação da corte portuguesa em terras brasileiras. A primeira universidade (a UFRJ) somente se efetivou em 1920, enquanto o regime universitário foi instituído com a Reforma Francisco Campos, em 1931.
No estado cearense, em que pese à criação do curso em Direito no limiar do século XX, sua primeira instituição universitária (a UFC) concretizou-se apenas em 1954, sob a persistência de Martins Filho. Quanto ao Sertão dos Inhamuns, o advento dos cursos superiores foi postergado para 1995, quando, não sem enfrentar resistências, o então reitor da UECE, Paulo Petrola, implantou o Centro de Educação, Ciências e Tecnologia (CECITEC), em Tauá. À época, Petrola argumentou que uma microrregião não pode ser condenada à ausência de instituições por conta de sua posição geográfica e socioeconômica; pelo contrário, são os investimentos estratégicos que contribuirão para a reversão de um quadro histórico de isolamento e de ausência de oportunidades.
Recentemente, deflagrou-se uma grande polêmica em decorrência do anúncio de previsões orçamentárias, por parte do atual relator do orçamento da União, deputado Domingos Neto, para a criação, em Tauá, de um Campus da UFC (abrigando cursos da área de saúde) e do curso de Engenharia Civil, através do IFCE.
A despeito da portaria ministerial de abril de 2018, que suspendeu por cinco anos a autorização de novos cursos de Medicina, o que mais me entristece é a visão colonialista que concebe a universidade de forma elitizada, principalmente quando se tratam dos cursos que dão acesso a profissões historicamente mais valorizadas.
Longe de mim de defender uma política expansionista sem critérios qualitativos. Mas, é lamentável que no ano em que a universidade brasileira completa um século de existência, a mentalidade colonial ainda esteja a obstaculizar a democratização do acesso ao ensino superior.

segunda-feira, 9 de setembro de 2019

A FUNDAÇÃO DO CECITEC E SEUS IMPACTOS NO SERTÃO DOS INHAMUNS


(Discurso proferido por João Álcimo Viana Lima na solenidade de homenagem à primeira turma de formandos do CECITEC, em 30/8/2019)



Em uma de suas composições, Noel Rosa e Oswaldo Gogliano descreveram o seguinte cenário: “Seu garçom, faça o favor de me trazer depressa / uma boa média que não seja requentada, / um pão bem quente com manteiga à beça, / um guardanapo e um copo d'água bem gelada; / feche a porta da direita com muito cuidado, / que não estou disposto a ficar exposto ao sol; / vá perguntar ao seu freguês do lado / qual foi o resultado do futebol [...]”.
 A composição musical “Conversa de botequim”, gravada por Noel Rosa em 1935, retrata o tempo e o mundo de seu compositor intérprete, onde a malandragem e a boemia carioca eram por ele exaltadas, cantadas e vivenciadas. Nesse contexto, o botequim se convertia para muitos em parada diária e obrigatória, sobrando para os garçons muita conversa e várias exigências de seus clientes. 60 anos depois, no sertão nordestino, os botequins foram alçados à condição de ambientes, cujas conversas seriam impactadas pela presença da instituição universitária em seu território. É que o reitor fundador do Centro de Educação, Ciências e Tecnologia da Região dos Inhamuns (CECITEC) enfatizou que: “Quando uma universidade se instala em uma cidade mudam até as conversas de botequim”.
A frase do professor Paulo de Melo Jorge Filho (Paulo Petrola), que ilustrou a justificativa para a implantação do CECITEC, manifesta a crença no potencial transformador de uma instituição universitária. No Sertão dos Inhamuns, essa visão gerou expectativas em relação aos impactos que o Campus da UECE proporcionaria à educação e ao desenvolvimento socioeconômico dos municípios de sua abrangência.
À época, o então Reitor, asseverou: “Se não temos, na região, um Curso Superior, toda a juventude, a mais inteligente, a mais brilhante, é coagida, é obrigada, é forçada a emigrar. Vão fazer os cursos noutros locais e não voltam! Com ela vão as riquezas para outras regiões, as quais poderiam ser produzidas equitativamente. Permanecerão os que não têm as mesmas condições físicas, o mesmo ímpeto de vontade, de liderança”[1].
Portanto, uma microrregião não pode ser condenada à ausência de instituições por conta de sua posição geográfica; pelo contrário, corroborando a óptica do professor Petrola, são os investimentos estratégicos que contribuirão para a reversão de um quadro histórico de isolamento. Nessa conjuntura, o poder público e a universidade, em particular, devem assumir, a partir de suas atividades, um papel de liderança e de indução e propulsão do desenvolvimento e da sustentabilidade microrregional. Nesse sentido, configura-se para a instituição universitária o lema proposto pelo professor Antônio Martins Filho: “o universal pelo regional”[2]. Com efeito, sem negligenciar com seus princípios históricos, a universidade deve estar atenta com o meio no qual está inserida.
Para a criação do CECITEC, a Administração Superior da UECE conseguiu significativas adesões de autoridades, dentre elas o então líder do Governo estadual, o ex-deputado, natural de Tauá, Júlio Gonçalves Rêgo, bem como engajou a comunidade local nos trabalhos principiantes. Com esse espirito participativo foi criado um grupo de apoio e promovido o seminário “Os Inhamuns no Desenvolvimento do Ceará”, em 26 de novembro de 1993. Referido grupo foi composto por educadores e gestores ligados às prefeituras municipais e secretaria da Educação do Estado, além de representantes de órgãos não governamentais e de voluntários, sob a coordenação da senhora Maria Dolores de Andrade Feitosa.
A Resolução nº 743/94, deliberada pelo Conselho de Ensino, Pesquisa e Extensão (CEPE), em 3 de maio de 1994, autorizou a Universidade a implantar os cursos de Ciências e Pedagogia, ambos de Licenciatura Plena. Entretanto, para viabilizar o início do funcionamento do CECITEC, que se concretizou em 19 de junho de 1995, a UECE empreendeu uma série de outras ações, dentre as quais podem ser destacadas:

a)    A obtenção de sede própria, em Tauá (cidade sede do Sertão dos Inhamuns), em abril de 1994;
b)    o lançamento oficial do CECITEC, em setembro de 1994;
c)    a realização de curso pré-vestibular, de outubro a dezembro de 1994;
d)    a realização de concurso vestibular, em janeiro de 1995;
e)    a realização de concurso de provas e títulos para professores, em março de 1995;
f)     a minha nomeação para diretor do Centro, em maio de 1995.

Em diagnóstico elaborado pelo Grupo de Apoio, no final de 1993, constam os seguintes dados: “Temos um quadro de docentes onde a maioria é habilitada para o 1º grau menor, ocasionando assim uma situação contraditória de excesso e carência do professor ao mesmo tempo, como também o acúmulo de disciplinas para o docente de 2º grau (polivalência no 2º grau)”. Referido documento detalhou um cenário bastante desolador: “A docência das séries iniciais da rede municipal da Região é composta de leigos que não concluíram nem mesmo o 1º grau menor. A nível regional temos o 2º grau ensejando as seguintes habilitações profissionais: Magistério do 1º grau (de 1ª a 4ª série e Estudos Adicionais 5ª e 6ª série), Assistente de Administração, Contabilidade como também o 2º grau sem habilitação”[3].
Com base em evidências documentais e testemunhais, pode-se inferir que um conjunto de fatores foi determinante para que as licenciaturas de Ciências e Pedagogia fossem selecionadas como os primeiros cursos do CECITEC, tais como: a demanda real por profissionais com formação superior para atuarem na educação básica da microrregião; a tradição da UECE com os cursos de formação de professores em suas unidades interioranas; e a existência dos dois cursos em outros campi da UECE.
O primeiro vestibular (1995.1), em Tauá, registrou um número de 277 inscritos para as 160 vagas ofertadas, ficando a concorrência em 1,73 candidatos por vaga. Inscreveram-se 129 para Ciências (46,57% dos inscritos) e 148 para Pedagogia (53,43% dos inscritos). Em seguida, foram aprovados 89 vestibulandos, sendo 13 para Pedagogia (manhã), 16 para Ciências (manhã), 25 para Pedagogia (noite) e 35 para Ciências (noite).
Havia no Sertão dos Inhamuns uma demanda reprimida por cursos universitários. Esta foi refletida na média de idade dos primeiros alunos do Centro. De acordo com o levantamento realizado por seu controle acadêmico, a idade média dos 87 alunos matriculados, em janeiro de 1995, era de 26,4 anos. Essa realidade foi bastante alterada 24 anos depois, haja vista que em janeiro de 2019, os 77 calouros tinham em média 18,8 anos.
Convergindo com a dissertação de mestrado de Kelly da Silva (2011), da Universidade Federal de Viçosa, na qual ela investiga as relações de gênero no âmbito do curso de Pedagogia, este, em Tauá, registrou, em seu primeiro vestibular, 100% entre os aprovados e 95,27% entre os inscritos de predominância feminina. Em depoimentos colhidos juntas às ex-alunas da turma pioneira, foi destacada a convivência respeitosa e colaborativa entre os dois cursos, mas que o universo exclusivamente feminino suscitou-lhes brincadeiras com a rotulação de “florzinhas”, consideradas amigáveis pelas entrevistadas. Por outro lado, verificou-se na primeira turma de Ciências, que de seus 51 alunos aprovados no vestibular, a maioria era do sexo masculino (56,86%). 
Para o início de suas atividades administrativas, o CECITEC contou com as presenças de servidores públicos estaduais cedidos à FUNECE pela então Secretaria de Governo (SEGOV), pela extinta EPACE (Empresa de Pesquisa Agropecuária do Ceará) e pela Secretaria de Saúde. Assim, formou-se o primeiro corpo técnico-administrativo, composto por Ana Maria Bezerra Gomes Lopes, Antônia Dolide Carvalho Jataí, Carlos Antônio Soares Mota, Júlia Ribeiro Feitosa Lima (secretária) e Maria Luísa Uchoa Castelo. Além dos funcionários cedidos por órgãos estaduais, foi viabilizada a cessão, junto à Prefeitura Municipal de Tauá, de nove funcionários (sete auxiliares de serviço e dois vigilantes) e a cessão de dois servidores administrativos junto à Prefeitura Municipal de Parambu.
Sobre o período de janeiro a 19 de junho de 1995, Luisa Xavier de Oliveira (ex-aluna integrante da primeira turma e ex-professora deste Centro) dá o seguinte testemunho: “Quando a gente iniciou o ano em janeiro, a gente fez o vestibular e ficou na expectativa que não tinha acontecido concurso para os professores [...]. Sei que não pôde se viabilizar as aulas. Nós passamos o mês de janeiro até o mês de junho sem ter aula. E eu me lembro que as duas primeiras cadeiras não foram com os professores que haviam passado no concurso, mas com dois professores da UECE [de Fortaleza], que eram professores de Matemática, o Hipólito [Peixoto], e o que a gente chamava de Naná [Nascimento Braga], que era o professor de Produção Textual. Nós passamos o período de férias com esses dois professores”[4].
A solução encontrada com a lotação momentânea dos experientes professores Hipólito Peixoto de Oliveira (do CCT) e José Nascimento Soares Braga (do CH), resolveu, ao mesmo tempo, o problema do início das aulas (cujo cronograma estava atrasado) e a carência em face da não aprovação no concurso de candidatos para essas áreas; além disso, possibilitou que as instâncias institucionais, providenciassem a nomeação e posse dos professores classificados no concurso de provas e títulos, que havia sido homologado em 3 de maio.
Para que respondesse pela direção do Centro, fui o primeiro professor aprovado no concurso a ser contratado, em 29 de maio de 1995. Posteriormente, em 20 de julho, foram contratados os demais classificados no concurso. A primeira turma de docentes do CECITEC ficou assim constituída: Antônia Fádia Valentim de Amorim, Antônio Charles Silvério, Célia Maria Furtado Magalhães, Deusdedit Monteiro Medeiros, Francisco Assis do Nascimento, Geandra Cláudia Silva Santos, Isaías Batista de Lima, João Álcimo Viana Lima, João Batista de Albuquerque Figueiredo, Marbênia Gonçalves Almeida Bastos, Maria Ivanda Alves de Paula, Maria Ivanete de Sousa, Mônica Petralanda de Holanda e Vânia Alexandrino Leitão.
Quanto aos primeiros universitários, antecedendo à criação dos centros acadêmicos, foram criadas, de imediato, as representações discentes de cada curso. Ao ser concebido como um segmento estratégico, diretamente interessado e como força endógena para se associar em diversas ações na fase de instalação e etapas posteriores do CECITEC, o corpo discente foi receptivo ao chamamento da direção e teve participação destacada e colaborativa. A propósito, em 1995 foram realizadas 13 reuniões entre a direção do Campus e os representantes do incipiente movimento estudantil.
Sobre as condições físicas e estruturais do CECITEC, em seu primeiro semestre de atividades, Luisa Xavier de Oliveira relembra que:  “A nossa divisão de sala era apenas uma parede, uma parede com a parte de cima [até o telhado de amianto] descoberta; tudo o que acontecia num lado do CECITEC – era aquela parte de dentro do CECITEC – era o curso de Pedagogia; do outro lado era o curso de Ciências. [...]. A iluminação também, meu Deus do céu, era precária, me lembro que muitas colegas e, inclusive eu, ganhamos um quantitativo de grau nos óculos bem maior no final do CECITEC. [...]. A estrutura física do CECITEC não era conveniente a um curso, claro; banheiros precários, não tinha sala de aula, nós estudávamos dentro de dois galpões. Para terminar mesmo a aula tinha aquela coisa: todo dia um aniversário na sala de aula; quando um cantava parabéns o outro começava para acompanhar. No outro dia no curso de Ciências, a gente combinava essa brincadeira”[5].
Como pode ser observado, não obstante o início de seu funcionamento ter se realizado em sede própria, esta não possuía uma estrutura física adequada. No entanto, conforme atesta a professora Maria Ivanete de Sousa, isso não foi motivo para que os docentes e discentes do Centro não desenvolvessem um trabalho acadêmico pautado na qualidade e no compromisso institucional. De acordo com a sua opinião: “Além da estrutura física, que é só um dado, tem a questão de professores, a própria condição dos alunos, de sobreviverem, de resistirem nos cursos, de não desistirem. [...] A gente provou que estrutura física não é determinante para a qualidade do ensino, por que o curso de Pedagogia durante três anos consecutivos obteve nota máxima do MEC em termos de qualidade”[6].
Luciana Rodrigues Gonçalves (ex-aluna integrante da primeira turma de Pedagogia), acrescenta que: “Foi com bastante dificuldade que deu-se início às aulas, pois tínhamos espaço físico, mas não contávamos com salas de aula e estudávamos no pavilhão do Centro. Em compensação contávamos com bons professores, também selecionados pela UECE e que tinham bastante compromisso. Com o passar do tempo as maiores dificuldades foram sendo superadas e hoje quem entra para fazer parte do CECITEC encontra outro panorama. Mas me sinto feliz em poder ter feito parte desse processo desde o início”[7].
Sobre as inúmeras dificuldades enfrentadas, ouçamos a opinião da professora Geandra Cláudia Silva Santos (primeira coordenadora do curso de Pedagogia):  “[...] O Álcimo assumiu e começou a dirigir as atividades da forma, assim vamos dizer, mais primitiva e mais escassa em termos de instrumentos, de mecanismos, de condições de trabalho. Mas, aí é onde está: mesmo com isso conseguiu, com a união de todos, dos profissionais que aqui chegaram, professores, os outros colegas funcionários e também as pessoas da comunidade e os alunos que já entraram com o propósito muito grande – as primeiras turmas – não somente formar, mas de ver o CECITEC dar certo na região dos Inhamuns. Criou um trabalho assim integrado e que pôde abrir portas e um horizonte promissor no CECITEC”[8].
Fazendo jus à sua capacidade de mobilização, à sua natureza acadêmica e à sua vocação para o debate, no primeiro semestre este Centro promoveu diversos seminários e debates, com uma média de 138,6 pessoas por evento. Esse número é superior à quantidade de universitários à época, o que denota a participação de um expressivo público externo. A servidora técnica e ex-secretária do Centro, Antônia Dolide Carvalho Jataí destaca que, de fato, “tinham vários eventos e a comunidade era muito participativa no CECITEC”[9].
Em que pese ao fato do atraso no cronograma para o início das atividades acadêmicas, a conclusão dos cursos em oito semestres foi possível graças ao cumprimento de uma das metas estabelecidas no primeiro plano administrativo do CECITEC: A recuperação das disciplinas nos meses de férias. Além disso, em tempo hábil foram realizados os aproveitamentos de estudos, principalmente no curso de Pedagogia, em face das alterações ocorridas entre a proposta curricular inicial e a que foi elaborada pelos docentes e, posteriormente, aprovada pelo CEPE, em 1997.
Com efeito, em 26 de fevereiro de 1999 foi realizada a primeira solenidade de colação de grau do CECITEC, com a quantidade de 50 concludentes, o que representa 57,47% dos que haviam se matriculado quatro anos atrás. Trata-se, portanto, da TURMA DOS PIONEIROS DO ENSINO SUPERIOR NO SERTÃO DOS INHAMUNS.
Concebendo a amplitude, a complexidade e a dinâmica que permeiam as instituições universitárias e seus serviços, vejamos o posicionamento da professora Geandra Cláudia Silva Santos: “Eu sempre disse isso em vários locais, aqui dentro e fora, existe a Região dos Inhamuns antes e existe a Região dos Inhamuns depois do CECITEC. E o impacto é extremamente positivo, assim nem consigo [...] perceber o que de ruim ou de negativo o CECITEC possa ter trazido para cá. Porque eu entendo que a participação do CECITEC ela ultrapassa até o nível educacional – o trabalho com a educação, com a formação de profissionais da educação. O CECITEC tem um espectro de ação e de penetração na sociedade de uma natureza, eu acho, que total na vida, no fazer, no pensar do homem e da mulher da região dos Inhamuns. Então o CECITEC, ele tem oportunizado, vamos dizer assim, espaços para trabalho, para o mercado de trabalho, para profissionais qualificados e bem qualificados, mas ele também tem principalmente influenciado em políticas, em decisões, em organizações, em tomada de posições. Tem influenciado principalmente na consciência das pessoas. Claro, é um processo, não é um dado, não é um produto, é um processo que precisa, vamos dizer assim, ser aprimorado, ser até mais agressivo, ser repensado constantemente, mas eu acho que o CECITEC tem feito a diferença na cabeça, nas ações e na vida da Região dos Inhamuns”[10].
A fala de Geandra sintetiza a amplitude dos impactos do CECITEC, a partir do seu ano inaugural, na qualificação das conversas (incluindo as falas dos botequins), mas, sobretudo, na educação e nos diversos setores da sociedade que são por ele alcançados, de forma direta ou indireta.



[1] Apud. UECE. Projeto: Centro de Educação, Ciências e Tecnologia – Região dos Inhamuns – CECITEC; Campus Avançado – Sertão Central II; Campus Avançado – Vale do Curu; Campus Avançado – Maciço de Baturité. Fortaleza, 1995a. 51p.
[2] MARTINS FILHO, A. O Universal pelo Regional. 2. ed. Fortaleza: Imprensa Universitária, 1966. 332p.
[3] EQUIPE DE COORDENAÇÃO. Diagnóstico da Região dos Inhamuns. Tauá, 1993. 7p. (Texto digitado).
[4] Em entrevista concedida em 16 de dezembro de 2002 ao então aluno do CECITEC, Antônio Abílio de Araújo, no âmbito do projeto de Iniciação Científica que abordou o processo de criação do Campus de Tauá.
[5] Em entrevista concedida em 16 de dezembro de 2002
[6] Em entrevista concedida em 3 de outubro de 2002.
[7] Em entrevista concedida em 2 de abril de 2004.
[8] Em entrevista concedida em 11 de março de 2004.
[9] Em entrevista concedida em 1 de março de 2004.
[10] Em entrevista concedida em 11 de março de 2004.

terça-feira, 30 de julho de 2019

CECITEC: CONQUISTA E TRAJETÓRIA EM PROL DO FORTALECIMENTO DOS INHAMUNS.

CECITEC: CONQUISTA E TRAJETÓRIA EM PROL DO FORTALECIMENTO DOS INHAMUNS.


(Discurso proferido por João Álcimo Viana Lima na solenidade de transmissão do cargo de diretor do CECITEC, em Tauá, em 31 de julho de 1999).


A importância da política de interiorização da UECE

Em agosto de 1994, concluí o curso de História pela Faculdade de Educação, Ciências e Letras do Sertão Central, em Quixadá. Sete meses depois, tive o privilégio de concorrer ao Concurso de Provas e Títulos que visava formar a primeira equipe docente do CECITEC. Felizmente, obtive êxito. Mas essa conquista pessoal só foi possível graças ao processo de interiorização de nossa Universidade Estadual do Ceará. Como interiorano nato, obtive minha formação acadêmica na faculdade instalada em minha microrregião natal. E eis que, em março de 1995, após a divulgação do resultado do referido concurso, refleti e com muita emoção passei a perceber que a minha aprovação ia além de uma realização individual e que se configurava como um resultado positivo da política de interiorização ueceana.
Para minha surpresa, recebi o convite do então Magnífico Reitor – filho do vizinho Município de Arneiroz -, Prof. Paulo de Melo Jorge Filho, para vir iniciar os trabalhos do Centro de Educação, Ciências e Tecnologia da Região dos Inhamuns. O caminho já estava delineado: os cursos de Ciências e Pedagogia tinham sido autorizados pelo Conselho de Ensino, Pesquisa e Extensão; o Centro estava com prédio próprio; oitenta e nove alunos já tinham sido aprovados em concurso vestibular, treze professores aprovados aguardavam ansiosamente pela homologação do concurso. Porém, as atividades precisavam começar. E para tal, aceitei a incumbência, mantendo firme o compromisso de cooperar com a interiorização universitária e ciente de que com as atribuições às quais acabara de investir-me, teria que, através do CECITEC, criar mecanismos que resultassem em oportunidades reais para a população dos Inhamuns.

A fase inicial do CECITEC

Posso dividir a história do CECITEC, nesse primeiro quadriênio de existência, em quatro fases. A primeira corresponde de 7 de junho de 1995, quando iniciamos as suas atividades administrativas, até o final do referido ano. Se o propósito era iniciar o seu funcionamento, reuni imediatamente os funcionários colocados à disposição pelo Governo do Estado e pela Prefeitura Municipal. Em 19 de junho, os primeiros vestibulandos aprovados nos Inhamuns puderam, enfim, afirmar que estavam usufruindo, com mérito – diga-se de passagem – do direito de serem estudantes universitários. Mas muitos desafios estavam postos à nossa frente, tais como: a contratação dos professores concursados; a adaptação da estrutura do prédio em uma academia; divulgar, dar feição e buscar apoio ao CECITEC. Em julho, todos os professores foram concursados, inclusive os que ficaram em segunda colocação; as instalações físicas foram improvisadas, pois isso se fazia necessário naquele momento; e a direção contou, desde o início, com a adesão da comunidade discente, que se integrou no processo de fortalecimento deste Centro.

A fase de afirmação do Centro

A segunda fase corresponde ao ano de 1996, e denomino-a de fase de afirmação. Nesse período, foi realizado o segundo vestibular; o planejamento estratégico foi elaborado com uma grande participação dos segmentos da sociedade do Sertão dos Inhamuns; buscou-se a aprovação dos projetos dos cursos de graduação, com a redefinição de suas grades curriculares; a Biblioteca começou a ser instalada; na área extensionista, o Centro despontou com o Núcleo de Informática e com a oferta de cursos voltados para o setor agropecuário, buscando sintonizar-se com a vocação econômica desta microrregião; as salas de aula começaram a ser construídas; materiais permanentes reivindicados começaram a chegar para suprir parte de nossas necessidades administrativas e acadêmicas; os alunos despontaram fora do Estado, contribuindo significativamente para o Programa Universidade Solidária; os Centros Acadêmicos foram criados; temas relevantes passaram a ser tratados no ambiente do CECITEC.

A fase de expansão do CECITEC

Os anos de 1997 e 98 podem ser analisados como a fase da expansão das atividades do CECITEC. Novos alunos ingressaram nos cursos de graduação, ocasionando a carência de mais professores, funcionários e de sala de aula; além disso, as turmas pioneiras, que já haviam vencido o momento mais difícil, direcionaram-se para a conclusão de seus cursos. No setor extensionista, inúmeros cursos foram ministrados com recursos do Fundo de Amparo ao Trabalhador; implantou-se o Núcleo de Línguas Estrangeiras. O Centro Vocacional Tecnológico (CVT), no âmbito dos programas da Secretaria da Ciência e Tecnologia, foi instalado nas dependências deste campus, com seis modernos laboratórios: biologia, física, química, informática, eletromecânica e fitoterapia; foi realizado o Pró-Ciências, capacitando 79 professores oriundos de 13 municípios, nas áreas de ciências e da matemática, com experiências laboratoriais. Foi instalado um curso de pós-graduação lato sensu. Mesmo que timidamente, avançou-se na área de pesquisa, com a aprovação e o desenvolvimento de trabalhos de iniciação científica. Municípios da microrregião (Aiuaba, Parambu e Tauá), implantaram cursos de licenciatura breve para qualificar seus professores em nível superior. O Centro foi convidado para integrar comitês e conselhos de importância para os Inhamuns. Tauá sediou os X Jogos Universitários da UECE, recepcionando aproximadamente 500 acadêmicos de todo Estado. Os Festivais de Cultura Popular passaram a figurar no calendário anual do CECITEC. As palestras, os seminários, os debates e eventos de outras instituições passaram a acontecer cada vez mais frequentes em nossas dependências.

O CECITEC no estágio de sua consolidação

Entendo que a partir de 1999, o CECITEC alcançou o seu quarto estágio, que o denomino de fase da consolidação. E chegarmos a essa pretensão só foi possível porque superamos as dificuldades para avançar na caminhada. Temos que pensar em consolidação! Ora, já foram formados 60 profissionais, que imediatamente estão dando o retorno aos Inhamuns, pois mais de 80% deles estão atuando no magistério desta microrregião, inclusive uma profissional que aqui se formou é nossa professora bolsista. São 60 profissionais, e consequentemente, 60 trabalhos monográficos construídos nesta casa. Temos, por conseguinte, uma clientela em potencial para a implantação de um novo curso de pós-graduação. Mas devido a nossa expansão, temos pleitos que requerem urgência. Identifico, dentre eles, a construção de um espaço mais apropriado para a nossa Biblioteca Setorial e a ampliação do nosso Núcleo de Informática para melhor atendermos à comunidade acadêmica, cujos projetos já foram entregues à Administração Superior da UECE; a ampliação de nossa estrutura física, sendo que seu projeto arquitetônico já foi elaborado pela antiga Superintendência de Obras do Ceará; o reconhecimento dos cursos de graduação, junto ao Conselho de Educação do Ceará, cujos processos encontram-se em tramitação.

CECITEC – apoio e parcerias: agradecimentos pessoais

Percebemos, pois, que a Universidade é dinâmica e nos tempos hodiernos, é absolutamente imprescindível um “campus universitário” em qualquer microrregião estadual. E o CECITEC não é de responsabilidade apenas do Governo do Estado e da UECE. Ele como unidade que socializa o conhecimento, através do ensino, da pesquisa e da extensão, necessita de parcerias com prefeituras que compõem esta microrregião e com todos os segmentos organizados. Felizmente, essa parceria, academia e comunidade, é algo visível nos Inhamuns. Expresso categoricamente: o povo inhamunhense é deveras receptivo, tem potencial e sabe absorver e apoiar os investimentos positivos que aqui são feitos.
Quero, neste momento em que estou deixando a direção deste Centro, agradecer a todos que direta e indiretamente contribuíram para a implantação deste Campus e para com o meu mandato de Diretor. Agradeço àquelas pessoas que espontaneamente, quando o CECITEC estava apenas idealizado, fizeram parte do grupo de apoio, que foi coordenado pela senhora Maria Dolores de Andrade Feitosa. Enalteço o espírito público de três lideranças fundamentais para a efetivação dessa conquista: falo do ex-governador Ciro Gomes, do então deputado Júlio Rego e do ex-reitor Paulo Petrola, que confiou em meu trabalho e me apoiou decisivamente no início dessa campanha. Agradeço ao meu ex-professor e meu ex-diretor de Faculdade, Prof. Artur Pinheiro, que foi quem me indicou ao então reitor. Agradeço a atual Administração Superior e Intermediária da UECE, incluindo todos os diretores administrativos e pró-reitores; bem como ao Magnífico Reitor, Prof. Dr. Manassés Claudino Fonteles e ao Vice-Reitor, Prof. Francisco de Assis Moura Araripe, homem que conhece profundamente a nossa Universidade e que se dedica inteiramente à causa interiorana. Agradeço aos nossos competentes professores, responsáveis maiores pelo êxito adquirido deste Centro; aos grandes profissionais do CVT, que contribuem sobremaneira para o engrandecimento de nossas atividades; aos nossos valorosos universitários, que fortalecem este Centro, tanto por suas competências individuais, como pelo espírito de coletividade, de integração e de carinho. Hoje, temos alunos e ex-alunos, mas todos explicitam gratidão e reconhecem a importância do CECITEC. Sou eternamente grato aos nossos tão dedicados servidores. Destaco o apoio e a atenção das autoridades políticas, incluindo os deputados vinculados a esta microrregião, os prefeitos, vereadores, bem como de instituições públicas, instituições não governamentais, empresas privadas e de profissionais autônomos. Ressalto o imprescindível apoio da imprensa, que desde o início de nossas ações, de forma gentil, concedeu-nos espaço para divulgarmos o CECITEC, dando provas de compromisso para com o desenvolvimento local. Agradeço, enfim, aos filhos de Tauá e dos Inhamuns, que sempre olharam para esta instituição, com respeito, como é o exemplo do Movimento Pró-Colônia Tauaense.
Agradeço, por fim, a Deus, o Grande Arquiteto do Universo, a quem, conforme minha crença, devo inclusive o fato de ter vindo a Tauá e de ter me associado a um povo tão hospitaleiro.

O otimismo como estilo de trabalho e a valorização do caráter: em tom de despedidas

É bom que fique bem claro: estou deixando a direção do CECITEC, mas não estou saindo do CECITEC. Em absoluto. Sou profissional da UECE, com lotação neste Centro, a quem tenho um imensurável respeito. Respeito este também devotado aos Inhamuns e a Tauá, de quem me tornei seu filho com muita honra, graças ao título de cidadania, conferido pelos dignos parlamentares deste município. Não sei se exerci minhas atribuições de diretor a contento. Mas, tentei honrar o cargo que me foi confiado. Busquei empreender um estilo com otimismo, onde as lamentações cederam espaço à busca de resoluções dos problemas. Quanto à minha conduta, todos podem dar o seu testemunho – Reitor, Vice-Reitor, professores, alunos, funcionários, autoridades, amigos etc. Jamais os procurei, no sentido de denegrir esta ou aquela pessoa; jamais os procurei, tentando disseminar discórdia ou buscando algum proveito pessoal; Quando os procurei, tentei sempre explicitar o meu objetivo: conseguir algo em prol do crescimento do CECITEC. Entendo que acima do profissional, está o caráter da pessoa.
Saio feliz da direção do CECITEC, haja vista o clima de total normalidade que acontece neste processo de transição, bem como pelo fato de ter como minha substituta, uma profissional competente e extremamente comprometida com a educação e com a causa pública, a minha amiga, professora Marbênia Gonçalves de Almeida Bastos. E à Marbênia, dirijo-lhe sinceros votos de uma gestão profícua, reforçando o meu posicionamento de apoiá-la na trajetória de crescimento desta instituição.
 Corroborando o pensamento de Albert Einstein, transcrito no convite dos concludentes do semestre 1999.1, afirmo que “não basta ensinar ao homem uma especialidade, porque se tornará assim uma máquina utilizável, mas não uma personalidade. É necessário que adquira um sentimento, um senso prático daquilo que vale a pena ser empreendido, daquilo que é belo, do que é moralmente correto”.
Muito obrigado a todos. Viva o CECITEC!

quinta-feira, 28 de junho de 2018

QUERO OS TOSTÕES DE SETENTA / EM VEZ DOS MILHÕES DE AGORA.


QUERO OS TOSTÕES DE SETENTA
EM VEZ DOS MILHÕES DE AGORA.

(Poesia de João Álcimo Viana)

Prefiro que a inteligência
Conduza a bola no pé
E honre o trono do Pelé
Que fez pra os gols reverência,
Fez do futebol ciência,
Pesquisa que o mundo explora,
A arte que mais se adora
E magia que mais se ostenta.
Quero os tostões de setenta
Em vez dos milhões de agora.


Prefiro o jogo elegante
E a cadência de Tostão,
Menos músculo e mais visão,
Como meia ou atacante;
Prefiro o jogo ondulante
Com a patada de outrora
Na bola que corrobora
Que Riva lhe representa.
Quero os tostões de setenta
Em vez dos milhões de agora.


Prefiro o jogo com classe
Do Canhotinha de Ouro,
Vibrante como um calouro,
Preciso no chute e passe;
Se outro furacão passasse
Trazendo o Jair de fora,
A bola que hoje chora
De gols ficava sedenta.
Quero os tostões de setenta
Em vez dos milhões de agora.


Quero um Capitão fardado
Honrando time e patente,
Um cordial combatente
E com gol imortalizado.
Quero o tostão ou cruzado
Ou o réis que não vigora,
Pois sei que ele colabora
Pra o dólar sair do penta.
Quero os tostões de setenta
Em vez dos milhões de agora.

(João Álcimo Viana)