domingo, 12 de fevereiro de 2017

"ISSO DE VÊ NO SERTÃO DEPOIS DA TERRA MOLHADA", DE JOÃO PARAIBANO E SEBASTIÃO DIAS.

ISSO SE VÊ NO SERTÃO / DEPOIS DA TERRA MOLHADA


(João Paraibano e Sebastião Dias)


Esse mote foi cantado de improviso pelo notáveis cantadores João Paraibano e Sabastião Dias, no 4º Desafio Nordestino de Cantadores, em Recife. Vejam que primor poético!

JP - Feijão de corda e ligeiro
Uns catando, outros batendo
Arco-íris espremendo
A barra do nevoeiro
Riacho enchendo barreiro
Sapo fazendo enxurrada
Jia cantando sentada
Na tampa de um cacimbão.
ISSO SE VÊ NO SERTÃO
DEPOIS DA TERRA MOLHADA.

SD - Quando a tarde fica escura
No tempo que está chovendo
Vê-se um menino correndo
Atrás de uma tanajura
Ele sobe e perde altura
Devido a bunda pesada
Voa baixo e cai cansada
Que a bunda estoura no chão.
ISSO SE VÊ NO SERTÃO
DEPOIS DA TERRA MOLHADA.

JP - Ninho de fura-barreira
Na barreia do riacho
Nambu cantando debaixo
Das moitas da capoeira
Velho tapando goteira
Descendo e subindo escada
Uma lata enferrujada
Pra bica tocar baião.
ISSO SE VÊ NO SERTÃO
DEPOIS DA TERRA MOLHADA.

SD - Quando a manhã mostra o brilho
Um sertanejo contente
Enche as cuias de semente
Vai pra roça e leva o filho
Coloca três grãos de milho
Na cova da terra arada
E na mesma cova cavada
Bota mais três de feijão.
ISSO SE VÊ NO SERTÃO
DEPOIS DA TERRA MOLHADA.

JP - A água turva e revolta
Da terra ensopando o seio
Riacho gemente cheio
A mata de folha envolta
Canjica cozinha solta
Pamonha ferve amarrada
A palha verde emendada
Mostra o nó que os dedos dão.
ISSO SE VÊ NO SERTÃO
DEPOIS DA TERRA MOLHADA.

SD - Quando tem rama na flora
Aí o caboclo diz
Que agora ficou feliz
Porque já chegou melhora
Pego os ferros e se acocora
Debaixo de uma latada
Dá pancada na enxada
Que o martelo cai da mão.
ISSO SE VÊ NO SERTÃO
DEPOIS DA TERRA MOLHADA.

JP - A voz do galo desperta
Os portadores da brenha
Por curvas que o rio tenha
Se arrastando a água acerta
Em cada uma cova aberta
Uma semente é plantada
E a terra grávida se enfada
Com o peso da gestação.
ISSO SE VÊ NO SERTÃO
DEPOIS DA TERRA MOLHADA.

SD - O campônio à terra ajeita
Bota veneno e saúva
Queima a broca, espera a chuva
Em março a planta está feita
Mês de junho é a colheita
De feijão e pamonhada
Em agosto a farinhada
Em outubro o algodão.
ISSO SE VÊ NO SERTÃO
DEPOIS DA TERRA MOLHADA.

JP - O trovão fala no centro
Menino cai do beliche
Velho vendendo maxixe
Velha arrancando coentro
A mosca voa e cai dentro
De um caldeirão de coalhada
Transa morrendo afogada
No leito de um caldeirão
ISSO SE VÊ NO SERTÃO
DEPOIS DA TERRA MOLHADA.

SD -  Açude estoura a comporta
Que a força da cheia obriga
Nesse período a formiga
Corta a verdura da horta
Guarda um pouco do que corta
Por estar necessitada
E a outra parte é guardada
Que é pra comer no verão.
ISSO SE VÊ NO SERTÃO
DEPOIS DA TERRA MOLHADA.

JP - Matuto em cima do muro
Batendo enxada e fumando
Periquitos gargalhando
Nos pés de moleque duro
Galo ciscando o monturo
Galinha choca deitada
Pra defender a ninhada
Do bote do gavião.
ISSO SE VÊ NO SERTÃO
DEPOIS DA TERRA MOLHADA.


João Paraibano e Sebastião Dias

Áudio com o improviso do mote.

sexta-feira, 10 de fevereiro de 2017

A "ESQUERDA DEMOCRÁTICA" DE ROBERTO FREIRE.

A "ESQUERDA DEMOCRÁTICA" DE ROBERTO FREIRE


(João Álcimo Viana Lima, em março/2014)

O deputado Roberto Freire (SP) e presidente nacional do PPS, em artigo publicado no jornal Brasil Econômico, voltou a falar sobre o que ele compreende e qualifica como “esquerda democrática” no cenário atual da política brasileira.

Recém-aliado do governador Eduardo Campos (PE) e presidenciável pelo PSB, Freire rebuscou alianças entre “comunistas” e “socialistas” no estado de Pernambuco, de onde ele é natural. Conforme o referido parlamentar: “O alinhamento das forças democráticas de esquerda representa um reencontro histórico entre os socialistas e o PPS, herdeiro do Partido Comunista Brasileiro (PCB). Desde a origem do PSB, com a redemocratização pós-Estado Novo, a aliança com os comunistas se inscreveu em páginas marcantes da vida política brasileira. Em Pernambuco, um dos estados mais avançados do país na luta democrática daquele período, essa união levou ao surgimento da Frente do Recife, movimento que elegeu Pelópidas da Silveira prefeito da capital, em 1955, e Miguel Arraes governador do estado, em 1962”.

Em meados de 2011, Roberto Freire, no site do PPS, escreveu o seguinte: “Creio que no quadro partidário brasileiro, em que a direita está preocupada em apoiar quaisquer governos e deles participar; o PT se divide entre mercadismo liberal e social-democracia, e o PSDB vacila na defesa de seu legado, o desafio da esquerda democrática não é apenas refundar-se”.

No Brasil, a definição de um partido ou de um político como sendo de “esquerda”, “direita”, “comunista”, “socialista”, “liberal” e “social-democrata” ganhou contornos de muita complexidade nos últimos quinze anos. Credito isso, entre outros fatores, a composições políticas bastante heterogêneas e ao fato de um partido autoidentificado como de esquerda está na presidência da República há quase doze anos. A propósito, a ex-senadora Marina Silva (também, recém-aliada de Freire), ao criar a Rede Sustentabilidade, disse esta que não se tratava de um partido “nem direita, nem esquerda”, mas que estava “à frente”.

Esse “reencontro” histórico mencionado por Freire não passa, a meu juízo, de uma rememoração histórica, afetiva e ideológica de cinquenta e sessenta anos atrás, que não provoca ressonância no quadro de alianças desejadas e não encontra sintonia com o pragmatismo das atuais “forças democráticas de esquerda” defendidas por ele.   

De simpático (e tolerante) aos governos de Fernando Henrique Cardoso (PSDB), Roberto Freire, que apoiou a campanha vitoriosa de Lula (PT) no segundo turno de 2002, adotou, desde muito cedo, uma postura crítica, transformada depois em oposição contumaz, ao governo petista. A partir daí, viu-se o PPS como aliado de primeira hora das coligações que teve o PSDB em primeiro plano e o PFL (atual DEM) em segundo plano, nas eleições presidenciais de 2006 e 2010.

Retornando ao seu artigo de 2011, Freire nos dá a entender que os partidos de direita são aqueles (e tantos) fisiologistas, sempre aliados do governo do momento, seja ele qual for. Relembrando o alinhamento do PPS nas últimas eleições, resta-nos indagar ao seu presidente se nessa “refundação” das “forças democráticas de esquerda”, há espaço para a inclusão do DEM, partido defensor do “mercadismo liberal” e marcado por posições conservadoras.

Roberto Freire: "Simpático e tolerante" dos governos de FHC e opositor contumaz dos governos do PT.

quinta-feira, 9 de fevereiro de 2017

A RELEVÂNCIA DAS AVALIAÇÕES EXTERNAS NA EDUCAÇÃO: SPAECE E AMET.

A RELEVÂNCIA DAS AVALIAÇÕES EXTERNAS NA EDUCAÇÃO: SPAECE E AMET


(João Álcimo Viana Lima, em dezembro/2011)

O Sistema Permanente de Avaliação da Educação do Ceará (Spaece) teve suas provas aplicadas nas redes municipais de ensino, entre os dias 28/11 e 8/12, no 2º, 5º e 9º anos do ensino fundamental.

Ao conceber a avaliação externa como um meio e um mecanismo de transparência pública, tenho feito referências elogiosas ao Spaece e, consequentemente, ao PAIC (Programa Alfabetização na Idade Certa), implantado no Governo Cid Gomes. Outro aspecto a ser destacado é que a SEDUC também teve o mérito de mexer com os brios dos prefeitos e dos gestores e técnicos municipais de educação, com a exposição favorável ou desfavorável dos indicadores de aprendizagem, especialmente os do 2º ano.

Sinceramente, não me causa preocupação o espírito de concorrência que gerou entre municípios e entre escolas. Seria mais preocupante se as secretarias municipais de educação e as escolas não estivessem engajadas para melhorar a qualidade da educação pública.

Em Tauá, além do SPAECE, a Administração Municipal implantou um sistema próprio de avaliação (o AMET), que, neste ano, avaliou 5.651 alunos, referentes ao 3º, 4º, 6º, 7º e 8º anos. O SPAECE, por seu turno, avaliou 3.138 estudantes do 2º, 5º e 9º anos.

A partir de um trabalho de acompanhamento processual envolvendo Assessoria de Ensino, equipe local do PAIC e escolas, aliado ao reordenamento da rede de ensino, ao processo seletivo para gestores escolares e a investimentos em formação e infraestrutura, dentre outros, espero que o sistema de educação tauaense tenha elevado substancialmente a proficiência de aprendizagem de nossos alunos. Esse será o maior prêmio para Tauá!
AMET: "Avaliou 5.651 alunos em Tauá".
SPAECE: "Exposição dos indicadores de aprendizagem".

EDUCAÇÃO INTEGRAL: PARA ALÉM DO MAIS EDUCAÇÃO.

EDUCAÇÃO INTEGRAL: PARA ALÉM DO MAIS EDUCAÇÃO


(João Álcimo Viana Lima, em dezembro/2011)

O Ministério da Educação (MEC) tem propagado a relevância dos sistemas de ensino implantarem a educação em tempo integral. No "Portal do Professor", por exemplo, é feita uma alusão à proposta de Anísio Teixeira e à escola por ele idealizada na Bahia, em 1950: o Centro Educacional Carneiro Ribeiro.

Em meio à concepção e aos esforços empreendidos, o programa Mais Educação, implantado em 2008, tem sido, na prática, a referência do MEC para a expansão da educação em tempo integral. É louvável a iniciativa e o investimento, na medida em que, conforme o próprio MEC (em texto publicado do "portal do professor"), são ampliados "espaços, tempos e oportunidades educativas", bem como são ofertadas "novas atividades educacionais", com fins de "reduzir a evasão, a repetência e distorções de idade-série, por meio de ações culturais, educativas, esportivas, de educação ambiental, de educação em direitos humanos e de lazer". 

O Mais Educação prevê a realização de atividades no contraturno das aulas convencionais, com tempo de três horas diárias. Em que pese à relevância destacada, referido programa, que amplia a jornada escolar, é insuficiente para o cumprimento de uma educação escolar efetivamente em tempo integral.

O mais grave é que para efeito de financiamento, uma escola que funciona 10 horas ininterruptamente é equiparada, pelo FNDE,  àquelas que oferecem atividades aos seus alunos no contraturno, sem a obrigação de servir almoço e de contratar profissionais para o turno intermediário.

Para muito mais além do Mais Educação ou outro programa de atividades complementares, a educação em tempo integral requer um aporte maior de recursos financeiros, sem deixar de levar em conta o tempo real trabalhado com os alunos.
Mais Educação: "Prevê atividades no contraturno das aulas convencionais".

O CRESCIMENTO DA EDUCAÇÃO TAUAENSE EM 2011.

O CRESCIMENTO DA EDUCAÇÃO TAUAENSE EM 2011


(João Álcimo Viana Lima, em dezembro/2011)

Em entrevistas concedidas a emissoras de rádio e em confraternização com os companheiros de trabalho, enfatizei que a palavra CRESCIMENTO era a que eu melhor definia para 2011 na área da educação, em Tauá.

O crescimento, a meu juízo, está evidenciado em muitas ações, dentre as quais destaco:

- na gestão, com a reordenação da rede (incluindo a nucleação de 34 escolas), a seleção de diretores e coordenadores pedagógicos, a criação do Colegiado dos Núcleos Gestores Escolares e a implantação do Programa de Formação dos Gestores Escolares (PROGET);
- na infraestrutura, com um amplo programa de reforma e ampliação de escolas, com a implantação de 76 laboratórios de informática e 10 salas de recursos multifuncionais (na perspectiva de ferramentas pedagógicas) e o início de funcionamento do Centro de Educação Infantil Profª Maria Gomes (em tempo integral);
- na valorização dos profissionais, a partir da ampliação das oportunidades de formação, agilidade nos processos de evolução funcional e o pagamento em dia e/ou antecipado dos salários, além de um 14º salário;
- no aspecto pedagógico, com o fortalecimento do acompanhamento diretamente nas escolas e com a realização processual de diagnósticos da aprendizagem, seguidos de intervenções necessárias. 

Ressalto, também, duas questões centrais para o crescimento de 2011: o equilíbrio financeiro e o planejamento como princípio norteador da gestão.

Após essa síntese, destaco a coragem e a determinação do prefeito Odilon Aguiar em tomar as iniciativas necessárias, que repercutiram favoravelmente no êxito da educação neste ano.

Por fim, agradeço a cada profissional da educação, incluindo todos os setores, todas as escolas e todas as funções, que, no cotidiano de 2011, fizeram e compartilharam as nossas inúmeras atividades. Conto com o trabalho e compromisso de todos para fazermos um 2012 com mais crescimento na educação de Tauá.

Um feliz 2012 para todos nós!

A GREVE DOS PMs E A IMINÊNCIA DE BABÁRIE.

A GREVE DOS PMs E A IMINÊNCIA DE BARBÁRIE


(João Álcimo Viana Lima, em janeiro/2011)
“Não venha para Fortaleza!”. Esta frase, com algumas variações de palavras, foi ouvida por mim (que moro em Tauá), no último dia 3, por meio de interlocutores que residem na Capital cearense. A motivação para a orientação foi decorrente da paralização das atividades dos policiais militares, deflagrada em 29/12/2010.

Em torno do lamentável episódio, ouvimos muito, de um lado, acerca da inconstitucionalidade do movimento (cf. §5º do art. 42 da Constituição Federal) e, do outro, sobre a necessidade de diálogo entre governo e categoria, haja vista que antigas reivindicações dos policiais militares e bombeiros não estavam recebendo a atenção necessária. 

O fato é que, mesmo sendo inconstitucional, o movimento dos PM’s e bombeiros conseguiu uma grande adesão de seus profissionais em praticamente todo o Estado. Apesar do reforço de tropas federais, o clima de insegurança, principalmente em Fortaleza, foi absoluto. A esse respeito, o jornalista Fábio Campos, no jornal O Povo, de 5/1/2011, disse o seguinte:“Chocada, a população se comportou como se houvesse um ‘toque de recolher’. Em plena alta estação, boa parte do comércio, restaurantes e demais serviços fechados. Clima tenso nas ruas. Temor generalizado. Um duro golpe na ordem pública e na economia”.

Com a situação felizmente contornada, fico com o sentimento de que a sociedade e a democracia foram as grandes perdedoras em todo esse episódio. Não há como negar os riscos (e os precedentes a partir do Ceará) de greves, motins ou aquartelamentos com militares armados. Mas a pior evidência foi a iminência de barbárie. Em pouco tempo (a paralização durou seis dias), a população teve que aderir ao “toque de recolher”, por conta de bandos organizados e semiorganizados ou pessoas individualizadas (bandidas ou candidatas a tais) iniciarem um festival de “arrastões”, saques e assaltos (Cf.http://noticias.uol.com.br/cotidiano/2012/01/03/com-greve-da-pm-violencia-aumenta-e-fortaleza-tem-arrastoes.jhtm).  

Graciliano Ramos, em "Memórias do Cárcere", afirmou que “as circunstâncias nos agarram”. Mas, como é que pode, em meio às circunstâncias da ausência de policiais, tamanha rapidez e avidez de várias pessoas que estão à margem da lei e da sociedade? Se o entendimento entre Governo e PMs tivesse demorado mais alguns dias, como teriam ficado os órgãos públicos, os estabelecimentos privados, as residências, os serviços e o Estado? 

Apesar dos avanços em nosso País, socialmente, nosso Estado de direito e democrático ainda precisa evoluir bastante. Torço para que outras circunstâncias, sob a ótica constitucional e sociocultural, possam nos “agarrar”, de forma a promover o bem-estar social.

SEU LUNGA: A CONSTRUÇÃO DE UM PERSONAGEM POPLAR.

SEU LUNGA: A CONSTRUÇÃO DE UM PERSONAGEM POPULAR


(João Álcimo Viana Lima, em novembro/2014)


Joaquim dos Santos Rodrigues, o Calunga (na boca de uma ex-vizinha de Caririaçu, onde ele nasceu), ou simplesmente e totalmente o Lunga (e mais tarde, seu Lunga), que se mudou para Juazeiro do Norte aos 16 anos, fez-se um dos personagens mais populares do País.

Nascido em 1928, foi casado durante 63 anos com dona Carmelina, com quem teve treze filhos. Seu Lunga carregou as marcas do sertanejo agricultor e proprietário campesino (embora tenha vivido no ambiente citadino desde a adolescência), do devoto de Padre Cícero (sua grande referência de fé) e da severidade na formação e condução da família, algo herdado de seus ascendentes. Feito comerciante, dedicou seu cotidiano, durante muitos anos, à labuta em sua loja, inicialmente de cereais, até chegar ao ramo de sucatas e variedades. Mas, não foi seu trabalho na agricultura e comércio que o tornaram famoso. Sua fama foi decorrente da pecha de “abusado”, “afobado”, “bruto”, “mal humorado” ou “ignorante”.

O curioso é que ele sempre negou essa condição, embora admitindo que não gostava de perguntas bobas. Foi da espontaneidade de pessoas do seu convívio que a fama de “bruto” lhe foi imputada e se multiplicou alhures, popularizando-se e sendo difundida por pessoas fora de seus contatos e de seu alcance. Na difusão do Lunga, como homem de tolerância zero, entrou em cena o sarcasmo, com todas as doses de excesso, criação e estilo caricatural. A esse respeito, seu Lunga sentia-se extremamente injustiçado e ofendido, pois os casos relatados em torno de si e que fundamentaram e edificaram sua fama, segundo ele, são todos inverídicos. 

O certo é que, paulatinamente, o rótulo de ser o homem zangado de Juazeiro do Norte evoluiu para o título de “o homem mais bruto do mundo”. O que se tratava de relato espontâneo, passou a ser deliberadamente pauta de inúmeras reportagens de rádios, jornais e tevês, tema de dezenas de folhetos de cordel, objeto de estudo de trabalhos de pesquisa, conteúdo de livros, inspiração de personagem cênico, fonte para publicidade e atração cultural e turística de sua cidade.

Ao seu modo, Lunga reagiu à fama, que lhe chegou sem que a esperasse ou a desejasse, roubando-lhe a tranquilidade. Em várias oportunidades, revelou-se cético à sua importância e pelo fato de ele ser motivo de tanto assédio para entrevistas e fotografias. Mas, creio que, em seus últimos anos de vida, ele já assimilava (pelo menos, em parte) sua notoriedade. A partir dela é que foi revelada outra de suas facetas, a capacidade poética, com mensagens inerentes às suas origens, aos seus valores e ao seu imaginário. Com efeito, o poeta popular Lunga falou de boi mandingueiro, destino, mulher bonita, pessoas idosas, pássaros e de sua microrregião natal, o Cariri.

Dependendo de como lhe era feita a abordagem, sua receptividade podia ser elogiável. A propósito, nas vezes em que estive com alunos universitários, em aulas de campo, em Juazeiro do Norte, recebi solicitações para que, na terra do Padre Cícero, fôssemos ao encontro do seu Lunga. Na última vez, em dezembro de 2013, ele, ainda convalescente de uma cirurgia, atendeu-nos, na praça que fica defronte a sua residência, com muita cordialidade. Durante o encontro, valeram os vários cliques fotográficos.

Certamente, neste imenso Brasil, há outros “Lungas”, com dimensões psicossocial e cultural semelhantes às de Joaquim dos Santos Rodrigues. Contudo, por força de aspectos que fogem do padrão das razões objetivas, não ganharam o status de celebridade. O palco desse estrelato, seletivamente, ficou reservado para o seu Lunga do Cariri, com sua cearensidade e a despeito de seu imenso contragosto. 

Eu e seu Lunga.
Alunos de Pedagogia da UECE com seu Lunga.